domingo, 13 de março de 2011

É só preconceito - contra os evangélicos

Evento evangélico em São Paulo. Alguém em sã consciência imagina estar vendo uma multidão de racistas? Foto: CPAD
Em 2005, enviei a André Petry, articulista da revista Veja, uma carta em resposta a um artigo publicado por ele naquela revista onde os evangélicos são retratados como intolerantes e até mesmo racistas. Segue abaixo o texto da carta o qual continua - infelizmente - atual:


Prezado André Petry,

Li seu artigo publicado na Veja de 2/11/2005 na qual nós, evangélicos, somos chamados de intolerantes, preconceituosos e racistas. Nele, somos acusados de perseguir os cultos afro e, por conseqüência, estimular o preconceito racial. Nada mais falso.
Em primeiro lugar, não restringimos a fé a uma manifestação cultural de uma sociedade ou etnia. Isso seria restringir a crença de um indivíduo ao nível do folclore. Suponho que esta interpretação seja agradável a sociólogos e antropólogos, especialmente àqueles que alegam não crer no transcendental. Uma religião é uma visão espiritualizada de mundo, uma forma de explicar, de dar significado e de se posicionar diante da vida. Todo o ser humano tem o direito de ser informado de que existem outras formas de pensamento e escolher, de acordo com as suas convicções, aquela que melhor explica a sua realidade. Por isso vemos ocidentais que professam o budismo ou o hinduísmo e vemos árabes e hindus se convertendo à fé cristã – mesmo ameaçados de morte por seus conterrâneos por terem tomado esta decisão. Creio que a interpretação dos textos bíblicos defendida pela fé evangélica pentecostal é mais lógica e coerente e, por isso, não apenas nela congrego como também a divulgo.
Talvez o senhor não saiba, mas existe um interessante livro chamado A Religião Mais Negra do Brasil, escrito por Marco Davi. O senhor sabe qual é? A fé evangélica pentecostal. Sim, há mais negros freqüentando templos evangélicos no Brasil do que terreiros de religiões afro e por um motivo simples: não vêem a fé como um dado cultural a ser herdado de seus antepassados e transformado em prisão sócio-étnica-folclórica, mas sim como uma jornada intelectual e espiritual em busca de respostas que satisfaçam os anseios de sua alma. E este dado é uma fato para os dois lados: há mais terreiros de religiões afro no Rio Grande do Sul do que na Bahia. Por sua lógica, esses praticantes destes cultos não deveriam ter abandonado sua fé luterana ou católica, visto que são descendentes de alemães e italianos. Mas o livre pensamento não pode ficar preso a questões étnicas ou folclóricas. Nosso passado é uma referência, não uma prisão.
Um outro dado importante: pregamos que todos os seres humanos são criação de Deus e que todos os que crêem em Jesus tornam-se filhos de Deus – independente de posição social, intelectual ou étnica – somos todos irmãos. Talvez por isso eu possa perceber uma maior quantidade de casais de etnias diferentes dentro das igrejas evangélicas do que no restante da sociedade.
Concordo que o pensamento de Baby do Brasil foi primário: Não há correlação entre tragédias e fé. Nova Orleans pode ter muitos praticantes de vodu, mas também tem muitas igrejas cristãs. A Bíblia diz que o sol nasce para bons e maus e a chuva desce sobre justos e injustos, portanto, atribuir um caráter punitivo a catástrofes naturais é um erro, salvo as duas exceções que a Bíblia revela – o dilúvio e a destruição de Sodoma e Gomorra – e ambas no Antigo Testamento.
Na verdade, seu artigo, ao se apegar a este fato isolado, é apenas mais uma forma de demonstrar preconceito, intolerância e desconhecimento do que seja a fé evangélica (deve ser terrível, ser chamado de preconceituoso e intolerante, não?) Vamos citar alguns exemplos da forma como nós evangélicos somos retratados nos meios de comunicação:

- Cansei de ler na imprensa matérias citando bispos católicos e “bispos” evangélicos. Por que a diferença? Aspas são usadas em duas situações: quando são a citação de terceiros ou quando denotam ironia. Ou seja, de qualquer forma, o repórter está dizendo que não considera aquele líder eclesiástico digno de ser chamado de bispo, como se esta nomenclatura fosse uma prerrogativa exclusiva da igreja católica. Mas um monge budista não é descrito como “monge” budista.

- Se o famoso padre Zeca organiza um evento Deus é 10 no aterro do Flamengo atraindo de 10 a 15 pessoas no Aterro do Flamengo, é primeira página na grande imprensa do Rio. Se a Igreja Batista da Lagoinha ou alguma outra organização lota o Maracanã, não há nem traço de cobertura.

- Enquanto a passeata do Orgulho Gay de São Paulo que leva uma multidão à Avenida Paulista tem ampla e detalhada cobertura, a Marcha para Jesus que leva o dobro de pessoas, tem uma cobertura pífia.

- Na teledramaturgia da Globo, o único grupo religioso que recebe a duvidosa honra de ser retratado como ignorante, preconceituoso e recalcado somos nós, os evangélicos. Todos os demais personagens que professam outra fé são mostrados como pessoas simpáticas, éticas e espiritualizadas. Nada contra, só gostaria se ser retratado assim também! Ou isso não é preconceito?

- Na novela da 6 – Alma Gêmea, e na novela das 8 que começa às 9, América – São diariamente veiculados os postulados da fé espírita. Se a Globo pode utilizar um veículo de massa para pregação religiosa travestida de novela para milhões, independente da crença, da origem, da cultura ou da etnia dos seus milhões de telespectadores, porque nós evangélicos não podemos divulgar nossa crença para outros? Não estamos impondo nossa fé a ninguém, estamos dando, isto sim, subsídios para que tenham liberdade de escolha.

- Muitas reportagens tomam a Igreja Universal do Reino de Deus como parâmetro, embora segundo o censo 2000 do IBGE ela esteja muito longe de ser representativa do universo evangélico – seja por questões numéricas, seja por questões doutrinárias. Com isto, ignoram a maior denominação evangélica do país – as Assembléias de Deus (da qual faço parte) - e igrejas igualmente importantes por seu passado secular e contribuição para a sociedade na forma de escolas e hospitais como as igrejas Batista, Metodista e Presbiteriana, isto somente para citar algumas.

- Recentemente, um grupo missionário foi alvo de críticas porque salvou a vida de duas crianças indígenas doentes tirando-as temporariamente de sua aldeia para se tratar no hospital. Antropólogos acreditam que estas crianças deveriam ser deixadas para morrer já que este é o costume da tribo. Por esta mesma lógica, o ocidente não deveria promover campanhas contra a medonha castração feminina que ocorre em diversas tribos africanas e árabes. Mas a questão é mais profunda do que a manutenção de um costume, é questão de lutarmos pela vida e pela dignidade humana, independente de cultura, etnia ou religião.

Não estou dizendo que somos perfeitos ou anjos na terra. Sim, há no nosso meio pessoas intolerantes, que tem dificuldade de compreender aquele que pensa diferente, assim como também há nas torcidas organizadas, na política e até mesmo na ciência, mas isso não quer dizer que a intolerância é algo inerente a nenhuma destas atividades. Somos pessoas que comentem erros e acertos e que lutam a cada dia para serem melhores, segundo o exemplo de nosso mestre Jesus Cristo. Aliás, a grande diversidade de igrejas e de doutrinas que há dentro do segmento evangélico mostra que não somos tão intolerantes ou monolíticos assim quanto se pensa, ao contrário, somos abertos às diferenças.
Também sou um admirador de Rosa Parks e do pastor batista Martin Luther King e acho que a igreja evangélica brasileira ainda está devendo a nossa sociedade profetas da justiça para denunciar as várias formas de pecado que grassam por esta terra: corrupção, indiferença, materialismo e hedonismo que nos impede de vermos e ajudarmos o nosso próximo, seja ele quem for. Mas não será com demonstrações de indiferença ou de preconceito dos meios de comunicação contra a comunidade evangélica que vamos melhorar este quadro.
Mas, quer saber? Tudo bem. Jesus e seus seguidores também foram chamados de tudo o que se possa imaginar: loucos, blasfemos, comilões, beberrões, agitadores, hereges, ignorantes, etc. Em materia de preconceito e discriminação, nós evangélicos, estamos bem acompanhados.

2 comentários:

  1. Robson,
    Parabéns pelo blog. O Evangelho precisa de gente como você para deixar o gueto e abandonar algumas armadilhas. Inteligência, atualidade e espiritualidade estão presentes aqui. Isto é ótimo. Thereza
    http://ubeblog.ning.com/ é o link da União de Blogueiros Evangélicos. Ela está esperando por você.

    ResponderExcluir
  2. Oi Thereza,
    Segui seu conselho e me inscrevi na UBE. Ótima dica!, existem muitos blogs e pessoas interessantes lá para troca de experiências e ampliação do conhecimento.
    Muito obrigado!

    ResponderExcluir