sábado, 17 de março de 2012

Fé e Ideologia: quem guia quem?



O ser humano é guiado por suas convicções. Algumas delas são religiosas, outras são ideológicas ou, vá, políticas. Mas será que é possível conciliar estas convicções de origens tão distintas?

E neste processo de conciliação. Sua fé norteará suas convicções políticas ou será o contrário, sua fé será moldada e, porque não dizer, distorcida, para se encaixar na ideologia que move a sua vida?

O mundo se debate em duas grandes linhas ideológicas: direita e esquerda. No Brasil ser de direita não dá cartaz, então quem é de direita geralmente diz que “com a queda do Muro de Berlim estes conceitos estão ultrapassados, etc. e tal”. Já quem é direita costuma por a culpa de todos os males no capitalismo, é favorável a tudo o que a mídia diga que é progressista e contrário a tudo o que esta mesma mídia diga que é reacionário ou conservador, mesmo sem saber bem por quê.

Mas o que é direita e esquerda mesmo? Vamos primeiro ver o que é direita:

Direita é o termo geralmente utilizado para designar indivíduos e grupos relacionados com partidos políticos ou ideais considerados conservadores (em relação aos costumes) e/ou liberais (em relação à economia), por oposição à esquerda política.

Os direitistas podem ser divididos em quatro tipos básicos: libertários, liberais clássicos, democratas-cristãos e conservadores.

Os primeiros são liberais em relação à economia e nos costumes,alguns podendo defender algumas bandeiras comuns a parte da esquerda. Os democratas-cristãos podem ser moderadamente liberais em relação à Economia (defendendo a chamada economia social de mercado) mas conservadores nos costumes. Os conservadores tendem a combinar o conservadorismo nos costumes com uma grande diversidade de posições na área econômica, que vão do liberalismo econômico ao neomercantilismo.”

Como acabamos de ver aí em cima, não há uma direita, mas diversas direitas, que variam de visão tanto na questão dos costumes quanto na questão econômica. Nos EUA, vemos prevalecer os conservadores, especialmente no partido republicano. Isto fica bem claro nos discursos dos pré-candidatos a presidência dos EUA, cada um deles puxando seu discurso ou para o conservadorismo dos costumes ou para atacar a participação ativa do governo na economia.

Mas o que isto tem a haver conosco?

Bom, não há dúvida de como o movimento evangélico como um todo, e o pentecostal em particular, é fruto do trabalho missionário estrangeiro, especialmente de missionários americanos a partir da segunda metade do século XX. E junto com sua fé, trouxeram sua visão de mundo, fruto da mistura de suas convicções religiosas com suas convicções políticas.

O resultado disto é que hoje temos cristãos que acreditam piamente que um bom cristão não pode ser de esquerda (implicitamente isto quer dizer que tem de ser de direita), ser contrário a um Estado forte e presente, ser um defensor não apenas do capitalismo, mas do self made man – o homem tem de progredir pelo seu próprio esforço e qualquer tentativa de auxiliá-lo o transformará em um preguiçoso.

Nos EUA é ainda pior: muitos acham que um bom cristão tem de defender o porte (e o uso) de armas pelos civis, ser favorável a intervenção militar dos EUA em qualquer canto do planeta e que poluição jogada na atmosfera pelas indústrias não influenciam as mudanças climáticas que já estamos passando.

E quanto a esquerda? Vamos mais uma vez ao Wikipédia:

a esquerda é considerada a posição que geralmente implica o apoio a uma mudança do enfoque social, do governo em exercício, com o intuito de criar uma sociedade mais igualitária.

O espectro da esquerda política varia da centro-esquerda à extrema-esquerda. O termo centro-esquerda descreve uma posição ligada à política tradicional. Os termos extrema-esquerda e ultra-esquerda se referem a posições mais radicais, como os grupos ligados ao trotskismo e comunismo de conselhos. Dentre os grupos de centro-esquerda estão os social-democratas, progressistas e também alguns socialistas democráticos e ambientalistas (em particular eco-socialistas, esses no sentido tradicional. O centro-esquerda aceita a alocação de recursos no mercado de uma economia mista, com um setor público significativo e um setor privado próspero.

Integrantes da esquerda costumam ser liberais nos costumes, alinhando-se a alguns grupos de direita, como os libertários, por exemplo. Tanto liberais de esquerda como de direita defendem a regulamentação da união civil homossexual, a descriminalização do aborto, a legalização das drogas e outros temas controversos. Há, porém, aqueles que, embora defendam propostas de esquerda em relação à economia (intervenção estatal direta no combate à pobreza) e à política, são conservadores nos costumes.”

Como podemos ver, do ponto de vista ideológico, há uma verdadeira salada para todos os gostos.
Diferentemente das igrejas pentecostais, muitos integrantes das igrejas católica e das igrejas protestantes históricas se sentem mais à vontade com o ideário da esquerda, participando ativamente, inclusive de diversas ações sociais em defesa dos menos favorecidos.

Mas a Bíblia diz que não podemos servir a dois senhores. O problema é quando a ideologia que acreditamos entra em choque com aquilo que a Bíblia ensina. Quando isto acontece, podemos perceber claramente que para que lado vai o coração de alguns cristãos:

Já tive o desprazer de ler um artigo de um ulta conservador defendendo que a escravidão, embora errada, pelo menos possibilitou que os negros pudessem conhecer o evangelho e se converterem. Não teria sido mais fácil ter enviado missionários para a África do mercadores de escravos? O articulista que escreveu esta pérola se apresenta como um defensor da fé cristã, mas uma leitura acurada de seus textos percebe-se que ele na verdade, defende o ultraconservadorismo norte-americano. O cristianismo é apenas um artifício para isto.

Também já li notícias acerca de líderes de igrejas históricas não apenas defendendo como até mesmo consagrando pastores e bispos homossexuais, alegando que os tempos mudaram e a igreja hoje tem de ser inclusiva. Mas o que fazer com o texto bíblico que diz que os sodomitas ficarão de fora do reino dos céus? Riscar de suas Bíblias? Pular o versículo de forma envergonhada? Ou dizer que Deus se enganou ou estava errado quando inspirou a escrita deste texto?

Li certa vez um artigo que chegou ao cúmulo de supor que uma coleta de mantimentos para os irmãos necessitados na igreja de Jerusalém no século I seria a causa dela ter passado por uma fome que levou a que as igrejas de outras cidades a socorressem também com mantimentos. Não há nenhuma base bíblica, histórica ou arqueológica que sustente este ponto de vista. Mas para quem defende o self made man, ver a própria Bíblia descrevendo não uma esmola individual mas uma prática sistemática da igreja de apoio social é visto como contraditório a sua crença ideológica, e é preferível distorcer ou mesmo extrapolar o texto bíblico do que abrir mão desta convicção política.
Em um órgão de imprensa ligados a igrejas históricas de clara tendência de esquerda, leio notícias de apoio explícito a governo totalitários como o de Cuba e o da Venezuela e uma crítica intensa contra governos de direita, mesmo que democráticos. Mas ignoram completamente o impedimento da blogueira cubana Yoani Sánchez de sair da ilha ou a perseguição que Hugo Chávez da Venezuela e Rafael Correa do Equador fazer à imprensa sem seus países. Dois pesos e duas medidas, quando a Bíblia exige de nós seguirmos a reta justiça.

Em todos os exemplos acima, pinçados das mais variadas vertentes políticas o que vemos é a manipulação, consciente ou não, da fé cristã em nome de uma ideologia política.

Jesus Cristo disse que não se pode servir a dois senhores. E ele disse isto citando explicitamente às riquezas, fato este que o defensores do ideário da direita procuram esquecer. Porém, quando Judas reclamou de uma mulher ter gasto um caríssimo bálsamo despejando-o sobre Jesus, Ele retrucou dizendo que “os pobres sempre tereis convosco”, fato este que a esquerda também tenta esquecer, acreditando que por meio de revoluções políticas alcançaremos a justiça social.

Se cremos que o evangelho de nosso Senhor Jesus Cristo é a expressão de um pensamento divino e, por consequência, perfeito e eterno, então ele não deve ser usado como muleta para o apoio desta ou daquela ideologia pois estas são humanas e, portanto, falíveis e passageiras.

Entre minha fé e minhas convicções políticas, fico com a minha fé. Afinal, para onde eu quero ir não é nem pela esquerda e nem pela direita que se chega lá. É pelo alto.

Um comentário:

  1. Muito obrigada pelo comentário na Guerreiros de Deus,Robson,vindo de quem ganhou o Prêmio Areté em 2007, é um elogio de peso. O Moebius é fantástico mesmo. E sim, é um desafio fazer a Guerreiros, mas estamos vencendo e em abril sai a versão impressa.Gostaria muito de ver vc no lançamento da revista no Rio de janeiro.
    Abç
    Paz!

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